domingo, 5 de abril de 2009

A PRIMEIRA BRASILIA

Minha mãe costuma utilizar provérbios e ditos populares para várias situações. Alguns bem conhecidos ("o que não tem remédio, remediado está" ou "filho de peixe, peixinho é"), outros nem tanto ("as águas calmas são as mais profundas"). No caso da minha primeira experiência como motorista, coube bem o famoso "casa de ferreiro, espeto de pau".
Apesar da grande maioria das minhas atividades automobilísticas terem acontecido através das mãos e das ações de meu pai, e ele ser, de fato, um supercompetente motorista executivo, não foi ele quem primeiro me colocou no banco do motorista e disse "engata a primeira e vamos embora"... Talvez (ou melhor, certamente) pelo fato do carro da família ser também aquele que trazia o sustento, não havia margem para se correr riscos. A expressão "garantir a disponibilidade", que tanto uso hoje tratando de máquinas para produção, entrou muito antes na minha vida. Foram necessários mais de 800 km de distância e a iniciativa de um tio para que eu desse minhas primeiras voltas no volante de verdade (e não apenas para lavar o carro...).
Meu tio Marco sempre foi um tio próximo e querido dos sobrinhos cariocas. Talvez pela jovialidade, talvez pelo bom humor, sempre tínhamos agradáveis momentos juntos em nossas viagens à Curitiba. E coube a ele me dar a oportunidade de dar umas voltinhas pelo quarteirão.
Colombo, cidade satélite de Curitiba, na época praticamente só tinha ruas de terra batida e bastante tranquilidade. Meu tio me pegou de surpresa com o convite. Eu, com 17 anos e já apaixonado por carros, obviamente esperava com ansiedade por um dia como este, e topei a aventura na hora. Ao entrarmos no carro, ele me perguntou se eu sabia como fazer um carro funcionar (na teoria, eu sabia tudo, né?), me deu algumas dicas e soltou uma frase que ficou gravada na memória: "pé esquerdo só serve para duas coisas nesta vida: chutar bola e pisar na embreagem". Com isto, estava quase assegurado que os pés não ficariam se embaralhando perigosamente nos pedais, e que tudo correria bem.
Ok, a primeira vez é sempre meio complicada para tudo. Perguntei a meu tio se ele sentia o motor do carro tremer. Ele respondeu que sim. "Pois é, tio, neste caso, não é o motor: sou EU que estou tremendo"... Claro que deixei o carro morrer algumas vezes, "colei" a cara de meu tio no vidro duas ou três, suava cachoeiras de tão nervoso, mas no final foi gostoso. O volante era esportivo (um Panther, da época, se bem lembro) e os engates do câmbio aconteciam quase naturalmente. O torque em baixas rotações tornava a aventura mais interessante ainda. Houve ainda uma segunda "sessão" onde minha mãe e mais uma turminha foram no banco de trás, acompanhando. Não vi se alguém estava cravando as unhas de medo no assento traseiro, mas quando acabou, todos disseram que foi tudo bem.
Por fim, o detalhe mais interessante de toda esta história, e que você já deve estar imaginando: este carro do meu tio, de fato, era uma BRASILIA!... De um tom de vermelho quase vinho, era bonita como acho toda Brasília bonita, ainda mais naquele dia ensolarado. Mas, engraçado, passados mais de 15 anos, ainda lembro da sensação, da tocada, da precisão dos comandos e até mesmo da consistência do volante!
Tempos depois soube que aquela Brasília teve um fim não muito feliz, por conta de um incêndio e uma confusão com mecânicos. Ainda guardo uma foto deste "piloto" ocupando seu "cockpit" no "possante". Mas nem precisaria: toda vez que toco neste assunto, um filme na minha cabeça me faz estar lá, com todos os detalhes, como se estivesse tudo apenas começando...
56 abraços!