domingo, 9 de agosto de 2009

TINTA I - A MISSÃO

Chegou a hora de comprovar na prática o que minha imaginação dava como certo: o quão linda ficaria uma Brasilia 4 portas na cor roxa! Estávamos no começo de 2004. Em Campinas, eu ainda não conhecia o trabalho de nenhuma oficina de lanternagem e pintura, o que me levou a tomar a decisão mais simples: escolher alguma bem próxima, onde eu pudesse, facilmente, estar acompanhando o andamento do trabalho.
Havia (e acredito que ainda exista) uma oficina na Avenida das Amoreiras, quase em frente à rua João Felipe Xavier da Silva, onde fica localizada a Bosch Chassis Systems. Estando próximo da empresa onde eu trabalhava, seria fácil aproveitar os intervalos de almoço, por exemplo, para visitar a brasa durante sua reforma. A oficina não era nenhum primor de limpeza e organização; por outro lado, os carros que lá encontrei me pareciam bem pintados e o dono era um cara simpático e de boa conversa. Levei a Brasilia para uma avaliação, o orçamento foi feito e, tudo certo, dei parte do dinheiro para a compra dos materiais. Isto posto, começaram a lanternagem que incluía troca das caixas de ar e do assoalho, entre outros trabalhos menores.
Mas eis que o destino nos prega "peças", por vezes, difíceis de entender. Por motivos sem importância neste momento, fui obrigado, contra minha vontade, a me desligar da Bosch em março de 2004. Se, por um lado, depois isto se mostrou útil (eu pude acompanhar a cirurgia de coração e a recuperação de meu pai no Rio), por outro, naquele momento, ficou uma sensação amarga e dolorida de um fim inesperado e indesejado. E rapidamente eu precisaria montar uma "operação de guerra" para minha mudança para o Rio, de volta à casa dos meus pais...
Com grande parte das "tralhas" (nossa, como a gente guarda troço!) eu abarrotei meu saudoso Santana branco e me aventurei 500 km até o Rio. Algumas coisas ficariam para trás, especialmente a Brasilia, pois não havia muito a ser feito: eu já havia pago boa parte do serviço e a oficina vinha cumprindo o combinado. Logo, tive que deixá-la por lá mesmo e ir "monitorando" por telefone o andamento das coisas. Como voce já deve ter imaginado, este tipo de "controle" está longe, muito longe mesmo, de ser o ideal.
Os momentos de crise, notadamente, são também aqueles que servem nos de "peneira", ou seja, onde os verdadeiros amigos se apresentam e lhe estendem a mão. E eu não posso deixar de mencionar Douglas Barthman (ou, carinhosamente, Barth), amigo e colega de Bosch que, desde o primeiro momento, se colocou à disposição para qualquer necessidade. Em sua casa ficaram meu computador, um sonzinho e o restante das coisas que eu não consegui levar na viagem com o Santana. Isto foi de suma importância para que eu tivesse o mínimo de tranquilidade para tratar daquela situação complicada.
Estando longe, o serviço começou a se arrastar; afinal, meu ilustre lanterneiro foi dando prioridade aos outros serviços menores e de grana mais rápida do que o meu. Quando finalmente coloquei uma data limite e mostrei o que queria, o serviço saiu. Voltei à Campinas, retirei o carro e notei que o cheiro de tinta ainda era bastante forte; ou seja, o carro havia sido pintado às pressas... Mais à frente, isto acabou fazendo com que eu tivesse novas "dores de cabeça" com a pintura dela. Naquela loucura toda, não consegui nem curtir o novo tom da minha brasa...
Além do final da pintura, fui também a Campinas para retirar as coisas que estavam com Barth, visto que ele estava de mudança. A foto que ilustra este post é deste dia, onde pode-se ver um lençol branco cobrindo tudo sobre o banco traseiro. Ainda sem uma definição de emprego no Rio, optei por deixar a Brasilia por um tempo em um estacionamento próximo à rodoviária de Campinas. Isto foi necessário para estabilizar as coisas e definir como traríamos "minha filha" para o Rio. O carro ficou lá por quase dois meses.
Definimos que meu pai seria o "piloto" da volta ao Rio. Em Campinas, fizemos uma revisão nos limpadores de para-brisa e meu piloto preferido pegou a estrada. Eu ainda fiquei mais dois dias para rever Barth e acertar os últimos detalhes. E na viagem de volta, no mesmo "Cometão" dois andares que tantas vezes me levou para visitar minha família, confesso que chorei. Chorei pouquinho e baixinho, pela dor e pela certeza de que ali era o fim daquela missão, e também pelo modo como tudo havia terminado.
Meu pai chegou bem da viagem. Reza a lenda (contada por ele, claro) que colocou 120 km/h no velocímetro da brasa beringela. Verdade ou não, dias depois fizemos a transferência do carro, onde finalmente meu "bólido" ganhou, em seu documento, a informação mais importante: "cor predominante: ROXA"...